O QUE DEVEMOS ENTENDER POR DIREITO

De início, deve-se enfrentar a grande pergunta: O que é o Direito? De antemão, um alerta preliminar: é complicado definir o Direito e nesse desafio tem se empenhado desde a Antiguidade até nossos dias um amplo leque de teóricos e ilustres personalidades de todos os tempos.

Primeiro, é importante definir os elementos que precisam constar em toda definição de Direito, não sem antes esclarecer a relevância que para conseguir resultados deva-se dar à linguagem.

1. Os problemas da linguagem para definir o Direito.

A primeira coisa a se ter consciência para estudar ou para enfrentar esse assunto é a seguinte: existe uma grande dificuldade para responder essa pergunta, mas antes de tudo, não por uma questão técnica, de sabedoria sobre Direito, mas por uma questão da linguagem, visto que o Direito utiliza a linguagem natural. Não existe uma linguagem específica, especial, única para o Direito como existe, por exemplo, para programação informática uma linguagem artificial.

O Direito utiliza a linguagem natural. As palavras que usamos como profissionais, na grande generalidade, são as mesmas utilizadas na linguagem natural. Junto a este problema temos outro que é o seguinte: existem palavras com mais de um significado, característica identificada como polissemia.

No Direito há o complicador adicional que a palavra (realmente o conceito) que identifica o objeto de estudo é a mesma palavra utilizada para designar o objeto de estudo, isto é: “Direito”.

Na linguagem comum, a palavra Direito, pode ser utilizada para referir-se às mais variadas situações e realidades.

Assim, por exemplo, revisemos as seguintes assertivas:

O Direito brasileiro é justo (1);
O Direito penal estabelece penas para os crimes (2);
O Direito brasileiro tem, em Reale, um dos mais importantes teóricos (3);          
Eu sempre me comporto direito (4);
O direito de matar o outro é crime (5);
Não há direito onde morrem milhares pessoas de fome (6);
Não são os governantes que criam o direito (a) à vida no Direito (b) porque ele existe no Direito Natural (c) que é anterior a eles. (7) [1]

Vejam como a mesma palavra tem diferentes significados. No (1) está se referindo ao Direito positivo brasileiro, ao conjunto de normas vigentes no Brasil. No (2) está fazendo referência a um ramo do Direito positivo brasileiro, o Direito penal. No (3) ocorre uma referência à ciência do Direito, só que a ciência dogmática jurídica, a ciência que estuda o Direito brasileiro. No (4) é uma maneira de comportamento, indica uma conduta determinada, preestabelecida. No (5) uma ação que está em algum lugar condenada como proibida. No (6) é um enunciado valorativo sobre o Direito, o direito à vida, o direito subjetivo que cada pessoa tem de viver. No (7), o (a) é outra referência ao Direito como sistema de normas, (b) ao Direito positivo e (c) outra forma de utilizar a palavra Direito, um tipo de Direito que alguns acreditam e outros não.

Muitos significados para uma mesma palavra. Esse é o grande problema que nós temos ao enfrentar a definição do Direito. Parece que não, mas justamente quando você vai definir o que é Direito, a primeira coisa que precisa ficar clara, é a o que você está fazendo referência. Da mesma forma que à palavra “Direito”, a palavra “Banco” ocasiona confusões devido à sua ambiguidade. Ninguém vai confundir a palavra “Banco” com a palavra “banco”, uma não tem relação com a outra, mas aqui, com a palavra “Direito”, todos os significados estão relacionados, todos giram em torno a um temas conectados.

A linguagem, então, é o grande problema que existe para a definição do Direito. Agora, temos um outro problema: vamos supor que eu afirme o seguinte: “Nós vamos falar de Direito”. Estou me referindo aqui ao Direito como Direito positivo. O significado estaria esclarecido. E o uso? Estaria esclarecido? Se eu disser que vamos falar agora sobre o Direito positivo, vocês poderiam se perguntar: Qual Direito positivo? O brasileiro ou o cubano? O espanhol? Qual é a dimensão desse significado, do uso dessa palavra quando relaciono ao Direito subjetivo?

Outro problema para responder à pergunta “O que é o Direito? ”, é que nos leva a outras perguntas. Não podemos ter uma definição clara do Direito sem passar previamente por outras três indagações. Será que o questionamento – O que é o Direito? – Não significa outras três perguntas? Ao invés de formularmos “O que é o Direito?,  não deveríamos formular:

a) Como é o Direito?
b) Para que serve o Direito?
c) Como deveria ser o Direito?

Isso nos levaria a três dimensões, a três coisas necessárias no momento de definir o Direito. Então, devemos, tratar três dimensões: estrutural, funcional e valorativa, sendo que cada uma delas corresponde a um posicionamento jus-filosófico.[2]

Esquema:

Positivismo – Estrutural – Validade – normas

Realismo – Funcional – Eficácia – fatos

Jusnaturalismo – Valorativo – Justiça – valor

2. Os elementos que devem caracterizar toda definição do Direito.

a) Territorialidade: Um certo âmbito de validade correspondente a uma certa área de abrangência, onde o sistema de normas postas pretende ser supremo e em consequência predominar em face a outros sistemas normativos e ordens reguladoras.[3]

b) Finalidade:  que é garantir o convívio pacífico e relações de natureza civilizatórias, que têm na igualdade, a liberdade, a justiça, o respeito mútuo e a tolerância seus postulados principais.[4]

c) Valor justificador: que segue, busca e defende um determinado ideal de justiça. [5]

d) Fisionomia: de instrumento de normatividade imperativa com a possibilidade de aplicar sanção. Direito como sistema de prescrições, de diretivas, cuja eficácia não depende das vontades dos destinatários.[6]

e) Estrutura institucionalizada: O Direito reconhece ou legitima certas autoridades normativas, atribuindo poderes e competências a determinados órgão e indivíduos.[7]


[1] Segue-se a ATIENZA, M. Introducción al Derecho. 4 ed. Barcelona: Barcanova, 1991.
[2] Uma leitura complementar necessária deverá incluir: KELSEN; NINO; RECASSEN SICHES; RADBRUCH; MORRIS; REALE.
[3] Essa ideia teve fundamento em ENGELS, F. e RAZ.
[4] Apoio imprescindível na leitura de DWORKIN, DELVECHIO; RECASEN SICHES; GOYARD-FABRE e o próprio REALE.
[5] No mesmo sentido, os autores anteriores com adição de RAWLS, PERELMAN e KAUFMAN.
[6]Uma defesa esclarecedora sobre essa característica do Direito em KELSEN.
[7]Uma compreensão dessa característica demanda leitura de HART.

BIBLIOGRAFIA BÁSICA


DWORKIN, Ronald. O império do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 1999. p. 477-493

RADBRUCH, Gustav. Filosofia do Direito. Coimbra: Antonio Amado, 1979, pp. 415-418.

REALE, Miguel. Lições preliminares de Direito. 25 edição. São Paulo: Saraiva, 2001. p. p.1-12

__________. Filosofia do Direito. 14 ed. São Paulo: Saraiva, 1991. p.285-621


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