PODER, FORÇA E RAZÃO
O poder é uma
instituição e um conceito social, que guarda muita e toda diferença com a força.
Sua institucionalização e justificação, em regra geral, garante em nível
intersubjetivo a submissão, inclusive como pré-condição da ordem, a paz e a
convivência humana. Poder representa uma autoridade em face a outrem ou algo
que permite gerenciar processos e situações, a tomada de decisões e em
definitivo a dominação. Esta última poderia ter como contexto societário-humano
as mais diversas relações entre pessoas.
Porém,
o poder que se tem de referência seria o regrado, cuja medida
é configurada à igual capacidade repressora e oportunidade de
utilização, assim, torna-se uma dominação limitada por regras que o convertam
em justificado e racional. Regras expressas de maneira suficientemente claras
pelo detentor do poder socialmente predominante, identificado como o Estado, a
partir de certo momento histórico, e que são apresentadas como o Bem
moral.
Max
Weber[1]
centralizou boa parte de seus escritos e obras de sociologia na dominação como
manifestação do poder. Para o sociólogo e economista alemão, dominar tem
relação intrínseca com a "probabilidade de encontrar obediência para
ordens específicas dentro de determinado grupo de pessoas”, frente às quais a
autoridade que se exerce está munida de legitimidade.
A
força é o inverso do poder. Embora tenha efeitos dominadores,
ela é bruta, com frequência injustificada e ademais irracional.
Quando
está em juízo, o poder (autoridade) para tomar decisões em contextos
jurídicos-políticos-sociais e morais que incidem e relacionam pessoas, sua
dignidade e suas liberdades e direitos fundamentais, é imperativo que atue com
legitimidade, o qual supõe, em primeiríssimo lugar, não exceder as competências
institucionalizadas que configuram a autoridade. Em segundo, se apegar a
procedimentos. E por último, uma inquestionável cobertura de racionalidade, que
ao final evidencia razões que se apresentam como justificativas das decisões.
Atos
de autoridades pelos quais tomam decisões sem plena e absoluta legitimidade são
manifestações de força, de abuso de poder e, em consequência, de
irracionalidade e inconstitucionalidade. Um atentado, por fim, contra aquela
referida legitimidade derivada da institucionalização constitucional.
O
fator determinativo para identificar quando se está frente a uma situação ou
outra, não é como não pode ser a discricionariedade ou a oportunidade
gerencial, nem a invocação de um interesse público obtuso, senão os fins com
que se exerce, a razão impulsora e motivadora. “Justo” é a razão impulsora e
motivadora a que qualifica os atos das autoridades e a atuação da Administração
Pública e seus agentes. Segundo esse critério poder-se-ia falar de abuso de
autoridade e com isso de arbitrariedade, ilegalidade e ilegitimidade. O
terrível acontece quando o poder se disfarça com discurso de moralidade e
utiliza-se o povo e os interesses públicos como a causa de um agir que na
verdade está sendo desmedido, desarrazoado e tanto excessivo como
injustificado. Tal acontecimento faz que o poder, institucionalizado e
legitimado torne-se força bruta e avance ao autoritarismo institucional.
As
regras postas que delimitam a atuação dos agentes públicos devem prevalecer
sempre por acima de boas intenções e de ações quixotescas que visem combater o
mal, a corrupção e a ilegalidade, porque tais regras são impeditivas de que o
poder vire força e o Estado de Direito um status a ser definido
circunstancialmente por cada agente e autoridade pública.
Uma
abertura na ideia formalista-positivista do Estado de Direito, definido apenas
como normas e regras procedimentais relativas ao agir limitado do Estado pelo
“Império do Direito”, implicaria ressaltar uma dimensão axiológico-moral de tão
relevante conceito cujo resultado imediato seria o consenso que aos limites
jurídicos tradicionalmente admitidos somar-se-iam o bom senso ético, o senso
moral comum e a observância limitadora da razoabilidade e a ponderação. Assim,
por exemplo, mesmo que amparado por competências e poderes legais e
institucionais, um agente ou autoridade não utilizaria e invocaria aquelas se
isto fosse incidir, restringir ou minimizar institucionalmente as competências
e poderes de outros agentes e autoridades. Conflito de Poderes evitado. Poder
preservado, força impedida e razão ressaltada.
[1] WEBER, Max. Economia
e sociedade: fundamentos da sociologia compreensiva. Brasília, DF: Editora
Universidade de Brasília: São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo,
1999.
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