O ALERTA NECESSÁRIO SOBRE AS REDES MUNDIAIS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO

O tema da redação do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) 2018 "Manipulação do comportamento do usuário pelo controle de dados na internet" exige o reconhecimento geral de acerto por parte do Ministério da Educação e Cultura e estão de parabéns os Especialistas que com muito bom senso elegeram tal temática.

Creio que uma sensata mensagem de fins educativos de valor incomensurável foi passada para mais de 5 milhões de jovens e adultos que participaram da edição de 2018 do Exame Nacional, mas que não se restringiu apenas aos participantes da prova, senão a todos que são usuários da Internet, pois existem evidências de que são alvos de excessos e ataques por parte de empresas, empreendedores, o próprio Estado e órgãos de segurança, aventureiros, bandidos e falsários, entre outros, incluindo, para completar, pais, parceiros e colegas.

As razões que poderiam justificar essa intromissão não são claras, quase nunca justificadas, invasivas o tempo todo, ilegítimas geralmente e ilegais na maioria dos casos. Que horror! É uma pena que o avanço tecnológico, o desenvolvimento científico e o progresso estejam sendo utilizado medievalmente, desluzindo a grandeza e a superioridade incontestável dos tempos atuais.

A Internet guarda os segredos mais íntimos, os solilóquios de horas de incertezas, as declarações mais profundas, os muitos sonhos que não são compartilhados, os passos ocultos, as ações proibidas, os desejos incontidos, e em geral, as faces mais discretas e silenciosas. Aquilo que não se quer confessar nem aos diários pessoais mais guardados, nem mesmo aos Padres, psicanalistas, psicólogos e conselheiros.

Como entender que entidades ou pessoas por mercantilismo, soberba, ambição, maldade, deslealdade e qualquer outro tipo de ação bandida assaltem o foro íntimo de terceiros e lucrem com aquilo que as pessoas têm de mais sagrado, que é a intimidade e a própria imagem? Não há como compreender, simplesmente porque não existe dentro da racionalidade argumentos para justificar agressões como essas.

Bom, o que cada um quer revelar de si, sua rotina, vida, intimidade, segredos, assim como o que quer compartilhar com conhecidos e desconhecidos é parte da autonomia de cada ser humano, atributo de sua liberdade pessoal. Ninguém tem o direito de dizer o que outro deve ou não deve ver, exibir, contar, distribuir, compartilhar, com a exceção civilizatória de não desmerecer os bons costumes sociais e a moral positiva. Certamente, a liberdade individual tem seus limites na segurança pública, no respeito aos outros e na convivência decente entre seres humanos em sociedades juridicamente civilizadas.

Entretanto, e contrariamente, não existem instrumentos que legitimem ou autorizem terceiros a utilizarem, divulgarem ou se aproveitarem daquilo que não lhe foi pedido. Fazê-lo é crime e invasão injustificada e sem causa contra a intimidade pessoal e própria imagem de outros, atributo existencial de cada ser humano e seu patrimônio individual, suficientemente reconhecido e protegido nas comunidades políticas minimamente evoluídas, para o qual se utilizam as Leis (principalmente a Constituição e outras dessa hierarquia e natureza), as autoridades normativas e os agentes públicos, que têm, entre outras funções, zelar pela integridade da pessoa humana e seus direitos e liberdades.

A hora é do Estado fazer algo contundente e significativo em favor das pessoas que se utilizam da Internet para comunicar-se, recrear-se ou para o que elas quiserem. Esse é o papel do Estado, isto é, proteger-nos frente a toda intenção, ação e até omissão que invadam a intimidade e própria imagem das pessoas, e por essa razão fundante optamos por entrar na sociedade civil e deixar para trás o estado de natureza.

Contudo, a tarefa, ou melhor, o desafio do Estado, do Direito, das autoridades e da própria tecnologia da informação é impedir, coibir, minimizar e extinguir a manipulação dos usuários por meio do roubo e controle de dados na Internet , que nem sempre acontece num âmbito que poder-se-ia considerar ilegal. Agrava-se a urgência do desafio ao se saber que em muito a questão tipifica ações imorais, antiéticas e desarrazoadas.

A manipulação de consciência, estados, ânimos e de opiniões das pessoas se utilizando de recursos e sofisticações tecnológicas, vulnerando a confiança expressa de clientes, consumidores e internautas em geral, é quando menos detestável, abusivo, primitivo e fora de toda moralidade, eticidade e justificativa. Deve-se agir antes que o avanço dessa ferocidade seja tanta que acabe sendo apreciado como normal por ter-se convertido em comum.

O primeiro a sinalizar é que a manipulação das massas devido à coleta indevida de seus dados viola cláusulas contratuais, visto que é contra a natureza do contrato assinado entre as partes que se relacionam visando serviços e comunicação. Então, resulta uma clara deslealdade contratual e por isso, quebra da confiança e da razão justificativa do vínculo, motivo suficiente para a sua anulação ao ir contra um principio jurídico de natureza contratual: “O contrato deve respeitar a sua razão fundacional, não sendo lícito às partes se utilizar do contrato e suas cláusulas para atacar a parte contrária”. Assim, toda manipulação de dados quebra o princípio “pacta sunt servanda”, e acarretará responsabilidade à parte infratora.

Não suficiente, a coleta e manipulação de dados de usuários ataca princípios relevantes ao Direito, a exemplo da boa fé e atributos essenciais como a certeza, a moralidade, a razoabilidade e a civilidade, todos impulsores da confiabilidade no clima social. Mal andará a convivência entre os seres humanos se a confiança não for elemento essencial das relações sociais.

Situação deteriorante que piora quando essa manipulação tem como fim alterar o jogo democrático e as regras de pureza e segurança que o protegem e dão garantia aos seus mecanismos e resultados. As presunções de manipulação de informações de usuários em processos democráticos em países ocidentais acendem as preocupações e obrigam a buscar com urgência remédios jurídicos, institucionais e também morais para combater essas ações de fins injustificados.

Espera-se que o Estado, através de seus Poderes de soberania, instituições e autoridades, voltem sua atenção para legislar atos normativos protetores, que devem ir desde a vigilância contratual ao funcionamento dos agentes tecnológicos e de comunicação que se desempenham nas redes mundiais de informação e comunicação. A União Europeia tem demonstrado de maneira exemplar como o combate deve começar. No Brasil iniciou-se esse processo com a recente Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais. E assim se almeja que siga em escala global, caso contrário, os impactos serão catastróficos no que tange à manutenção da privacidade, dignidade humana e democracia.

BIBLIOGRAFIAS GERAL:

BRASIL. Constituição Federal de 1988. Promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Artigos 12, 17, 20, 21, 113 e 422. Acesso: 5 de nov. de 2018.

BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de jan. de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Artigo 5, X. Acesso em: 5 de nov. de 2018.

BRASIL. Lei n. 8.078, de 11 de set. de 1990. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8078.htm>. Artigos 43 e 51. Acesso em: 5 de nov. de 2018.

BRASIL. Lei n. 13.709, de 14 de ago. de 2018. Dispõe sobre a proteção de dados pessoais e altera a Lei nº 12.965, de 23 de abril de 2014 (Marco Civil da Internet). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2018/Lei/L13709.htm>. Acesso em: 5 de nov. de 2018.




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